Pastorais SociaisVivemos num período histórico no qual muitos movimentos religiosos e políticos tendem a separar esses dois fenômenos sociais: a fé e a política. Há quem diga que são antagônicas, que não convergem, e até que são inimigas. Acredita-se que haja de fato uma má interpretação de conceitos e papeis: o que é e para que serve a fé e a política. Por isso aqui utilizaremos a terminologia fé-política em substituição de fé “e” política.

O conceito de política na sociedade contemporânea está um tanto fragilizado quando associado aos modelos de gestão dos recursos públicos atrelados ao sistema socioeconômico. A fé também passa por percalços com a crise das instituições religiosas, a qual faz parte da crise civilizatória, que por sua vez perpassa a todos e a tudo.

Para Frei Betto “a política é a estrada e a fé, o mapa da estrada. Sem mapa fica difícil construir uma estrada que conduza ao Reino. Sem estrada, o mapa fica no papel”. Portanto, ambas podem e precisam andarem juntas, e se tornam imprescindíveis. Rubem Alves define a política como a “arte da jardinagem aplicada às coisas públicas”. O político é como um jardineiro que cuida do jardim que é de todos. Não cuida somente pra si, mas para todos.

Por outro lado, hermeneuticamente a fé e a política tem origens em espaços diferentes. E o contexto territorial no qual ambas se encontram na conjuntura histórica atual das cidades tem se “desenvolvido” com rapidez, principalmente na América Latina. A política que vem de polis e que significa cidade, já nasce hoje num contexto “urbanizado”. É a forma de organizar e cuidar da cidade. A fé por sua vez, é originária do contexto rural, das pequenas tribos. Toda a fé tem uma relação forte com a natureza, com o sobrenatural, com o inexplicável, o indizível. A cidade (polis) está cada vez mais compacta, plural, controlada por grandes corporações comerciais. E a política, todavia tem sido instrumento de manutenção desse sistema, que na maioria das vezes promove a injustiça.

O encontro da fé com a política permite que tenhamos uma fé-política que permita que a vontade de Deus, a natureza, o transcendente, e os desejos do ser humano sejam integrados socialmente. O filósofo Hans Jonas adverte que “age de tal maneira que os efeitos de tua ação sejam compatíveis com a permanência de uma vida humana autêntica, ou ainda, não ponhas em perigo a continuidade indefinida da humanidade”. Em outras palavras Hans Jonas nos provoca a cuidar daquilo que é de todos (jardim), inclusive daqueles que hão de vir ainda.

É o olhar de fé, independentemente de credo, que permite projetar a vida para além de si. Com isso, Frei Betto aponta no Encontro Nacional de Fé Política que “toda a vivência da fé tem uma repercussão política”. A fé cristã essencialmente é uma fé política. Jesus Cristo em sua trajetória de vida transcorreu um caminho simultâneo de fé-política. Toda a sua caminhada e pregação em Jerusalém (centro do poder religioso e político) colocou em destaque a vida da periferia marginalizada, a Galileia.

A fé-política deve ser uma marca de todo cristão, que assume verdadeiramente os princípios e as opções de Cristo. O cristão, vocacionalmente, tem um compromisso com a transformação social, com a construção de um mundo diferente – a edificação do Reino. O cristão com a atuação política tem o compromisso com a transformação das estruturas do poder marginalizador que comprometem a existência da vida. O Papa Francisco profeticamente nos adverte: “envolver-se na política é uma obrigação para um cristão (…) temos de nos meter na política, porque a política é uma das formas mais alta de caridade, por que busca o bem comum”.

Diante disso, é imensurável a importância das CEBs na vivência da fé-política e na formação do cristão na igreja e sociedade. Roberto Malvezzi (Gogó), destaca no texto base do 13º Intereclesial das CEBs: “onde há cristãos comprometidos, é bem provável que eles tenham ligação com as CEBs e ou com as Pastorais Sociais”.

As CEBs são de fato esse “sempre novo jeito de ser igreja” comprometida com as causas do Reino e lançando lideranças de fé na atuação política. Oxalá todo cristão tenha uma fé politizada e aja politicamente sob o olhar da fé que promova a dignidade humana: justiça e paz.

Jardel Neves Lopes – Mestre em teologia, coordenador das Pastorais Sociais do Regional Sul 2, Assessor Leigo da Pastoral da Juventude da Arquidiocese de Curitiba, Colaborador de Projetos da Casa da Juventude do Paraná, Educador de Pastoral na Rede Marista de Solidariedade, Articulador da Rede de Integração das Entidades da Vila das Torres.

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